16/05/2010

G1

Livro de 1823 descreve resultado da necrópsia de engolidor de canivetes

Marinheiro americano John Cummings ingeriu objetos cortantes por 10 anos.
Alex Marcet, médico londrino, desenhou a coleção achada em suas tripas.

reprodução
Doutor Alex Marcet desenhou os restos de canivete localizados nas entranhas do marinheiro John Cummings
“Considerações sobre um homem que viveu 10 anos após ter engolido inúmeros canivetes, com uma descrição da aparência do corpo após sua morte” é o nome de um livro publicado em 1823 pelo médico londrino Alex Marcet. Ele reputava sua obra como “a mais impressionante ilustração dos poderes de autopreservação do estômago e dos intestinos”. O relatório inclui um belo desenho de próprio punho, em que o doutor Marcet mostra 38 objetos recuperados durante a necrópsia do finado.
 
A monografia do século XIX foi desenterrada esta semana por Marc Abrahams, organizador do IgNobel (paródia do Nobel que elege as pesquisas mais inusitadas do ano) e editor do periódico “Annals of Improbable Research”. As informações lhe foram passadas por Dan Meyer, presidente da Sword Swallowers Association International (sim, existe uma associação internacional de engolidores de espadas).
 
Clique aqui para ler o livro do doutor Marcet (13 páginas, formato .pdf)
 
O “herói” da história é John Cummings, um marinheiro americano que morreu em 1809 sob os cuidados profissionais do doutor Curry, amigo de Marcet.
 
Marcet resolveu então registrar tudo, baseado nas observações do colega e na “narrativa, escrita com grande clareza e simplicidade, pelo próprio paciente”. O diário foi encontrado no bolso de Cummings após sua morte.
 
Certa feita, de licença em um porto qualquer da França, Cummings e alguns companheiros deram de cara com um cidadão que engolia canivetes para entreter o público e levantar uns tostões. Depois de encher a cara como só um marinheiro de folga é capaz de fazer, Cummings gabou-se de ser tão capaz de engolir facas quanto o francês. Incitado pelos amigos (é para isso que os amigos servem), o americano mandou goela abaixo sua própria faca de bolso. Encorajado pela turma, encarou outras três.
 
A contabilidade da estreia foi esta: três dos objetos foram expelidos como manda a natureza. Mas o quarto, não. Seis anos depois, a pedido de gente festeira de Boston (Massachusetts), Cummings mandou para o bucho 14 canivetes. Nas semanas seguintes, como reportado pelo próprio marinheiro, ele foi “liberado de sua carga em segurança”.
 
O padrão se manteve por muitas e tantas vezes. Canivetes entravam. Alguns saíam. O tempo, as marés e os ventos levaram Cummings à Inglaterra. Por diversas vezes, foi internado no Guy’s Hospital, fundado em 1721 por Thomas Guy, um editor de Bíblias e especulador que ficara milionário.
 
Em 1808, Cummings virou paciente do doutor Curry, sob os cuidados de quem foi definhando miseravelmente até morrer, em março de 1809.
 
Fichinha
Mas a cutelaria abrigada no bucho de Cummings, informa Abrahams, é fichinha comparada aos grandes feitos na área obtidos desde então. O Glore Psychiatric Museum em St Joseph, no estado do Missouri, conserva para a posteridade coleções como 78 garfos e colheres (mas nenhuma faca, nenhum canivete) removidos das tripas de uma pessoa que também tragou saleiros e mais de 1.000 outros itens. “São exemplos perfeitos dos excessos da cultura consumista”, conclui Abrahams.